Ficção

Patrícia

Imagine uma pessoa que consegue falar com a vida. Conheçam Patrícia: seus desafios, sua superação e o diálogo que ela teve.

(Eu…)

Preciso confessar umas coisas.

Preciso falar, tirar isso do peito.

Chego em casa e sinto o vazio…

Isso acontece há anos.

Constatação.

Só agora, aos 36, comecei a prestar atenção e perceber que o intenso vazio interno transborda para o externo (ou será o contrário?).

Na verdade, sempre transbordou. Transborda tanto que determinou quem sou para o mundo.

Relacionamentos fugazes, temporários, eletrônicos, sem começo ou fim, diluídos numa existência apressada, onde mudam-se os rostos e os corpos que não significam nada, ao final das contas.

Relacionamentos profissionais, pessoais e amorosos se confundem na mesma falta de consistência. Na mesma falta de conteúdo. Na mesma falta de essência.

Tento desesperadamente compensar a falta de qualidade com a quantidade… E só tenho me magoado. Não consigo nada além da superficialidade e me pergunto por que é assim. Eu não entendo! Aliás, eu entendo sim… É tão óbvio… Está na minha cara. Eu não aceito, isso sim. A gente atrai o que transmite…

A vida foi acontecendo a mim e me empurrando para um canto. Tenho feito escolhas a minha vida inteira e só agora me dei conta de que até as escolhas que fiz, quando pequena, tem influência em quem sou hoje. Escolhemos muito mal durante boa parte de nossas vidas e só me dei conta disso agora.

Eu achava que responder aos desafios da vida era a meta de uma existência, mas terminei descobrindo que a realização e a felicidade são irmãs, que elas dependem das escolhas inadequadas que fiz…

As metas, a carreira, a família e as outras pessoas sempre colocadas acima de tudo.

Uma correria constante, uma busca eterna por resultados e agradar aos outros. Um foco doentio no destino, uma eterna reverência.

Quando as metas são dos outros, o destino também. Você termina chegando a vários lugares, mas nunca ao seu lugar. Sempre os lugares dos outros.
Quando o destino é alheio, pelo menos aproveite a jornada.

 

Insegurança.

E a jornada?

Ah, a jornada. Observando o passado, não lembro de quantas vezes olhei pela janela e vi a vida passando, mas não dei atenção porque o resultado importava mais.

Eu queria ter dado atenção à jornada.

Talvez eu não tivesse chegado até o momento presente arrependida. Talvez o destino deixasse de ser importante…

Talvez a jornada se transformasse no real objetivo… E dele eu tivesse extraído mais coisas, mais aprendizado, mais maturidade…

Talvez a minha felicidade não estivesse tão atrelada a momentos externos, pessoas e coisas e estivesse dentro de mim…

Talvez eu tivesse me valorizado mais e provocado toda uma série de consequências positivas em minha vida…

Será que as pessoas passam por minha vida sem tanta importância porque não me dou o valor necessário? Será que… Sou descartável?

Talvez…

(A vida fala…)

Despertar.

Não Patrícia, não! Não é isso!

Olhe-se no espelho e perceba que cada experiência comigo está registrada em uma ruguinha aqui, outra ali. Veja que cada aprendizado está marcado por fora e por dentro! Está na sua cabeça e no seu coração! Faz parte de você e é o seu maior tesouro!

Veja como isso lhe transformou numa pessoa de bom coração, numa mulher linda, que se importa com as pessoas e que quer crescer…

Mas não a qualquer custo! Não passando por cima de ninguém! Que respeita e ajuda o próximo!

Não há matéria mais rica do que essa e você pode mudar o mundo com ela!

Seus valores são sólidos e, a partir deles, você pode, sim, descobrir a sua missão.

Pergunte-se porquê! Pergunte-se até você chegar na resposta mais fundamental de todas, a resposta que sai do seu peito com força e emoção, depois de cavar e cavar… Depois de tantos porquês esvaziarem o seu repertório de desculpas, cortinas, proteções, vitimizações e excesso de auto-indulgência… Tantas camadas colocadas ao longo do tempo… Até você chegar na sua essência e responder com ela!

Perceba o quanto a consciência disso tudo lhe permite agir e mudar ainda mais quem você é! Ainda há tempo! Não foque no que foi… Foque no que pode ser, ainda!

O principal você já tem: beleza interior.

Não nascemos assim.

Nascemos apenas inocentes e vamos mudando…

Mudando por forças internas e externas que vão nos construindo…

Um efeito colateral da sua jornada. Essa beleza está intimamente ligada a cada cicatriz de uma forma mágica, quase que um combustível para lhe mover e transformar cada novo passo em um passo na direção adequada e compatível com a sua nova existência. Agradeça!

(O diálogo entre nós duas…)

Catarse.

Mas as pessoas estranharão minha mudança de comportamento?

Certamente. Você já mudou. Não há como voltar atrás.

Eu me distanciarei naturalmente das pessoas, coisas e situações que faziam parte do meu velho eu e farei novas amizades. Não por conveniência, mas por respeito a mim própria.

Saiba que vai doer Patrícia.

Eu sei… Mas é isso que eu quero. Não é uma questão de certo ou errado. É uma questão de ser.

Quero ser uma nova pessoa. Quero existir, no mundo externo, a pessoa que já sou internamente! Como é libertador ter essa consciência!

Vou começar pelo melhor lugar: por mim mesma. Dando a mim o valor devido. Amando-me. Evoluindo a cada dia, sendo protagonista, colocando para fora o que há de melhor em mim e sem me submeter… Desenvolvendo-me como ser.

(Eu…)

Renascimento.

Pouco mais de um ano atrás, eu não tinha ideia de que minha vida mudaria tanto. Olho para o passado e meu sentimento é de gratidão.

Gratidão por ter chegado em um momento insustentável, onde fui presenteada pelo Universo com ferramentas e lições. Com a capacidade de enxergar o que me era elusivo… Trazendo ao consciente uma existência incompleta, insalubre e tardia, que levou à dor, dor suficiente para provocar a mudança.

Gratidão por ser e me sentir uma nova pessoa! Mudei meus sentimentos, minhas convicções, opiniões e postura. Mudei minhas ações… Passei a existir diferente, melhor! Renasci! SOU uma nova pessoa, uma pessoa melhor!

Agora meus sonhos são de liberdade.  São de leveza, de evolução! São ricos e, ao mesmo tempo, humildes e sinceros… Alinhados com meus valores… Alinhados com a minha vida, permitindo-me ir adiante, aproveitando cada momento dessa jornada fantástica que é a vida.

O destino? Ah, eu tenho certeza de que essa estrada me levará ao lugar que eu mereço… e eu mereço o melhor: plenitude.

(Você…)

Esqueça por um momento a idade… Quantos temos uma Patrícia dentro de nós, talvez em uma ou outra fase?

 


Esta é uma obra de ficção. Qualquer semelhança com fatos, ocorrências, nomes, pessoas ou situações da vida cotidiana ou do passado é mera coincidência. A escolha do nome da crônica foi baseada na lista de nomes mais comuns no Brasil, divulgada pelo IBGE.

4 comentários

  1. Qualquer semelhança será mesmo coincidência? Afinal, “quantos temos uma Patrícia dentro de nós, talvez em uma ou outra fase?” 😉

    Adorei o texto! <3

    "Quando as metas são dos outros, o destino também." Está mesmo na altura de despertarmos e tomarmos o nosso destino para nós!

    Obrigada, pelo bom momento de leitura, Rómulo! 🙏

    1. Minha querida Susana,

      Fico tão feliz de ler o seu feedback!

      Sim, confesso que escrevi o texto pensando em uma pessoa específica, mas me enxerguei em uma ou duas fases! A minha intenção é mostrar para as pessoas que existe um caminho para fora dessa situação 🙂

      Um beijo!

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